Projeto do Estado de quitar dívida com Ipsemg gera polêmica

Divergências quanto aos valores devidos e sobre a origem dos débitos marcaram a audiência pública realizada pela Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária da Assembleia Legislativa de Minas Gerais para debater o Projeto de Lei Complementar (PLC) 35/07, que autoriza o Executivo a quitar sua dívida com o Ipsemg.

 

A proposição pretende equacionar o problema da dívida do Tesouro do Estado com o instituto por meio da compensação contábil de débitos e créditos gerados ao longo dos anos, o que foi criticado por deputados da oposição e representantes de contribuintes e de servidores, segundo os quais o Governo está propondo uma “manobra contábil” e “dando o calote” na dívida que o Estado teria para com o Ipsemg.

Já para parlamentares da base aliada e para representantes do Governo e do Tribunal de Justiça, o projeto traz benefícios para o Ipsemg, que de outra forma poderia ter suas finanças prejudicadas em função de emenda à Constituição Federal aprovada em dezembro do ano passado modificando procedimentos para o pagamento de precatórios.

O Projeto – Segundo o projeto original, o Tesouro assume os débitos relativos aos precatórios emitidos contra o instituto, no total de R$ 686.407.497,23, conforme apurado em dezembro de 2009. Esse valor é superior à dívida do governo com a autarquia, calculada em R$ 607.261.435,21 em fevereiro de 2010, conforme alega o Governo.

Na última reunião da FFO, o deputado Lafayette de Andrada apresentou o substitutivo nº 2 ao projeto, rejeitando o substitutivo nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça. O novo texto busca incorporar a proposta feita pelo governador de incluir os débitos caracterizados como requisitórios de pequeno valor (RPVs), apresentados contra o Ipsemg, quando os objetos das ações que os originaram forem anteriores à data de publicação da Lei Complementar 64, de 2002, que criou o Regime Próprio de Previdência e Assistência Social dos Servidores Públicos. O acréscimo, nesse caso, seria de cerca de R$ 70 milhões, referente aos RPVs previstos para 2010.

Além disso, o substitutivo nº 2 suprimiu o inciso II do artigo 1° do projeto, que autorizava o parcelamento do saldo remanescente em 120 parcelas mensais, porque, com a quitação da dívida, ficaria extinto o saldo remanescente. Segundo o parecer, o projeto não gera impacto sobre as contas públicas, pois é uma operação contábil envolvendo obrigações já previstas no Orçamento do Estado.

Dívida seria maior, denunciam entidades em defesa da saúde

Segundo o presidente da Associação dos Contribuintes do Ipsemg, Moisés de Oliveira Melo, já há na Justiça uma ação da entidade exigindo que o Estado faça uma apresentação da dívida, que segundo ele supera R$ 1 bilhão e 800 milhões. O dirigente anunciou que esse dado, bem como todos os levantamentos a respeito, constam de Relatório da Auditoria-Geral do Estado anexado à ação movida na Justiça e entregue nesta terça (13) à comissão. “O Estado tem que assumir essa dívida, e não tirar recurso da saúde para pagar precatórios”, criticou Moisés de Oliveira, que fez um histórico da situação do Ipsemg desde 1988 aos dias atuais. “As cidades polos até podem ter atendimento, mas essa não é a realidade da saúde no conjunto do interior do Estado”, denunciou ele.

A presidente do Sindicado dos Servidores do Ipsemg (Sisipsemg), Antonieta de Cássia Dorledo de Faria, também criticou a intenção do Governo. “O Ipsemg não precisa de ajuste contábil, precisa é de dinheiro para a saúde”, frisou ela, para quem o Governo está “maquiando” uma dívida que teria sido motivada por apropriação indevida. Isto porque, segundo a sindicalista, os precatórios têm origem em débitos previdenciários, apesar do recolhimento das contribuições dos servidores, e não em serviços de saúde, que pela legislação atual são o objetivo maior do Ipsemg.

Governo e Justiça citam emenda federal para defender projeto

Assessor especial da Secretaria de Estado da Fazenda, Eduardo Codo Santos defendeu o PLC e apresentou um histórico da situação legal do Ipsemg, lembrando que com a Lei Complementar 64/02, foram criados dois fundos para atendimento aos segurados, ficando estabelecido de forma clara que a prestação de serviços de saúde passariam a ser o foco principal da ação da autarquia.

Segundo ele, a emenda 62 à Constituição Federal, de dezembro de 2009, alterou as regras dos precatórios, impondo ao Estado 22 anos adiante para pagá-los. Minas, segundo ele, optou por fazê-lo em 15 anos. Eduardo Codo argumentou que na medida em que o Estado assuma os precatórios do Ipsemg, estará assegurando a capacidade de investimento do instituto em saúde. “De fato a responsabilidade pelos precatórios que o Estado quer assumir é do Ipsemg”, ressaltou.

Nassau Jan Louwerens, assessor da Seção de Precatórios do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, endossou a fala do representante do Estado ao informar que com a emenda 62, o Ipsemg terá bens sequestrados e sofrerá grande impacto caso não quite os precatórios. Segundo ele, caso o Estado não assuma essa dívida do Ipsemg, o instituto terá, entre outros prejuízos, que arcar mensalmente com o pagamento de R$ 4 milhões para cumprir o que determina a emenda 62, além do pagamento imediato de outros R$ 70 milhões.

Ao ser questionado por deputados como Adelmo Carneiro Leão (PT), autor do requerimento da audiência, Carlin Moura (PCdoB) e Antônio Júlio (PMDB), sobre a responsabilidade do Estado para com esses precatórios, Nassau Jan frisou por diversas vezes que todos eles são fruto de ações contra o Ipsemg, e não contra o Estado, já tendo transitado em julgado, não cabendo mais esse tipo de questionamento. “Insistir nesse ponto é uma guerra perdida”, concluiu o representante do TJ-MG.

Deputados divergem sobre intenção do Executivo

Apesar das colocações do representante do Tribunal de Justiça, o deputado Carlin Moura (PCdoB) considerou que “em nome de pagar precatórios, o Governo está criando um artifício para quitar o que o Estado deve ao Ipsemg”. Ele também lembrou que o projeto é de 2007, anterior à emenda 62 de 2009 destacada pelos que defenderam o projeto. O deputado Antônio Júlio também questionou qual era a lógica usada pelo Estado para querer assumir precatórios e com isso cancelar uma dívida que tem para com o Ipsemg e o deputado Weliton Prado (PT) definiu a proposta como “calote”.

Adelmo Carneiro Leão também insistiu na tese de que os precatórios, sendo originados de dívida previdenciária e não de serviços de saúde, deveriam ser de fato ser pagos pelo Estado e não entrar num ajuste contábil pretendido pelo Governo. Para o parlamentar, o Estado quer fazer um acerto de contas para poder ampliar sua capacidade de contrair empréstimos em prejuízo do Ipsemg e da área de saúde. “Se a origem dos precatórios deve-se a erros do Estado, aqui no Parlamento é o lugar de restabelecer a justiça”, defendeu.

Benefícios – Por sua vez, o deputado Domingos Sávio (PSDB) registrou não ser possível no Estado de Direito recorrer no Parlamento de uma decisão judicial. Para o parlamentar, se existem divergências quanto aos valores da dívida, eles devem sim ser avaliados com profundidade nos âmbitos administrativo e judicial, mas sem que se deixe de aprovar o projeto sob pena de prejudicar seriamente o Ipsemg.

O presidente da comissão, Zé Maia (PSDB), também considerou como “proposta fantástica” para o Ipsemg a prevista no PLC 35/07. Segundo ele, ao final da compensação contábil dos débitos o Ipsemg ainda estará ganhando cerca de 100 milhões. “As críticas mostram que o Ipsemg quer receber a dívida do Estado mas não quer pagar sua dívida. Enquanto o projeto vai tirar das costas do Ipsemg uma dívida de cerca de 700 milhões”. O deputado Lafayette de Andrada (PSDB), relator do projeto na comissão, também considerou o projeto “benéfico” para o Ipsemg. “Se os precatórios não forem pagos, o patrimônio do Ipsemg será confiscado, essa é a realidade agora com a emenda 62”, concluiu.

Fonte: ALMG