Cortes condenariam Unimontes à morte
Participantes de audiência pública na ALMG dizem que reforma administrativa segue desmonte da educação pública
A audiência da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (07/05), teve a participação de centenas de professores, alunos, funcionários, e também dos dois reitores da Universidade Estadual de Minas Gerais (Uemg) e da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes).
Eles denunciaram a precarização do ensino superior no Estado e pediram aos deputados que sejam interlocutores junto ao governo, para evitar que se concretize o corte de 20% no quadro de pessoal e de 10% na verba de custeio das duas universidades.
Muitos criticaram a reforma administrativa aprovada em turno único na ALMG, na última semana, que extinguiu a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Sedectes), onde estavam as universidades, levando-as para dentro da Secretaria de Educação (SEE), sem que esta tenha sido equipada para tanto.
Segundo a reitora da Uemg, Lavínia Rosa Rodrigues, novos cortes hoje representariam, na prática, o desaparecimento dessas universidades. Enfática, ela disse:
“Se quiserem demitir nossos funcionários e professores, terão que exonerar esta reitora primeiro”.
Relembrando a história de criação das universidades estaduais e o papel social que elas desempenham, Lavínia Rosa Rodrigues lamentou que professores com carga de 20 horas semanais recebam apenas 1.366 reais por mês na Uemg. Os cortes também prejudicariam centenas de estudantes pesquisadores que recebem uma bolsa de 425 reais por mês.
O reitor da Unimontes, Antônio Alvimar Souza, afirmou que os cortes no ensino superior vêm acontecendo há vários anos, enfraquecendo as instituições. A Unimontes tem sede em Montes Claros, mas está presente com faculdades em mais 13 municípios, nas regiões Norte, Noroeste, Jequitinhonha e Mucuri. Ao todo, segundo o reitor, as ações da universidade atingem mais de 2,5 milhões de pessoas, na região mais pobre do Estado.
Além de dezenas de cursos de graduação e de extensão, a Unimontes mantém um Hospital Universitário Clemente de Faria e um restaurante que atende aos alunos e funcionários, mas, segundo o reitor, teria começado o ano sem nenhum recurso em caixa. “Temos um compromisso com a comunidade! A universidade pública tem que ser protegida!”, disse Antônio Alvimar Souza.
Cortes atingem hospital e população mais carente
De acordo com Maria Clara Maciel de Araújo, da Associação dos professores da Unimontes, os cortes de verbas atingem diretamente o atendimento no hospital universitário. Ela afirmou que 65% da verba de custeio da universidade é gasta no hospital Universitário, que atende a população mais carente da região e realiza mais de 500 mil procedimentos por mês.
Um dos diretores do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sind-Saúde), Avilmar Augusto Pereira, disse que cerca de 80%, dos 1270 servidores da Unimontes, estão lotados no hospital universitário. Muitos deles já estão em idade de aposentar e continuam na ativa porque a aposentadoria é inviável diante do salário-base de cerca de R$ 600,00. O último concurso que nomeou novos servidores na Universidade foi realizado há 13 anos, em 2006.
“A demanda no hospital só aumenta, é como estar num Vietnã em tempos de guerra”, disse o sindicalista. Conforme Avilmar, mais de 160 mil pessoas do Norte de Minas e Sul da Bahia ficarão sem atendimento se a Unimontes tiver um corte de recursos de 30%.
Parlamentares criticam postura do atual governo
A deputada Beatriz Cerqueira (PT) alertou os presentes para o risco de que as grandes corporações empresariais dominem a educação. “Lutamos pela educação como direito do cidadão e como dever do Estado, contra um governo que quer um Estado cada vez mais ausente”, concluiu.
“O governo tem que rever sua postura em relação à educação”, disse a deputada Leninha (PT), autora do requerimento que deu origem à reunião.
O deputado Cristiano Silveira (PT) pediu o apoio da comunidade escolar para que esteja sempre presente na ALMG, pressionando os parlamentares a aprovarem as leis que defendem a educação, para que as discussões gerem ações concretas. Já o deputado Betinho Pinto Coelho (SD) lembrou que a defesa da educação é dever de todos, e deve estar acima de partidos políticos.
“Estamos abismados. Parece que há um pacto entre governo federal e governo estadual para acabar com a educação pública”, disse o deputado federal Paulo Guedes (PT). Os deputados André Quintão e Virgílio Guimarães, do PT, também reafirmaram suas críticas ao atual governador pelos cortes feitos na educação.
Ao final da reunião, a deputada Beatriz Cerqueira anunciou uma série de requerimentos com pedidos de providências, que deverão ser votados na próxima reunião da comissão. Entre eles, um pedido à Mesa da Assembleia para que seja apreciada com urgência a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10, de 2019, que estabelece o vencimento básico para os profissionais de educação do ensino superior.
O deputado Professor Cleiton (DC) prometeu “judicializar” a defesa das universidades estaduais, se necessário. “Não permitiremos que o projeto de recuperação fiscal do governo, que deve chegar em breve à ALMG, venha acompanhado da exigência de privatização dessas duas universidades”, disse.
Tadeu Martins Leite (MDB), Gil Pereira (PP), Carlos Pimenta (PDT) e Zé Reis (PSD), todos do Norte de Minas, declaram determinação em defender a Unimontes e a Uemg e não deixar que avance qualquer projeto de privatização dessas universidades.
Representante da SEE reafirma que falta de recursos impõe cortes
Único representante do governo presente à audiência, o assessor de relações institucionais da Secretaria de Estado da Educação, Leonardo Carvalho Ladeira, disse que a proposta de unificação das secretarias já estava colocada desde a eleição do governador Romeu Zema, e que os reitores das universidades foram avisados sobre as mudanças logo no início do ano.
“Não estamos impondo nada, queremos ser parceiros dos reitores, queremos integração entre educação básica e universidades”, disse ele.
O representante da SEE, no entanto, reafirmou que não existem recursos financeiros e que os cortes são necessários. “Infelizmente, não podemos continuar funcionando sem pagar, como vinha sendo feito”, concluiu, vaiado pelos estudantes e professores que acompanhavam a audiência.
Na Secretaria de Educação, a reforma cria a Subsecretaria de Ensino Superior para cuidar do funcionamento das universidades, mas a estrutura para seu funcionamento ainda não foi montada.
(Com informações da ALMG)