HJK: cresce debate sobre sucateamento

Comissão de transição foi escolhida durante audiência pública realizada no Barreiro de Cima e vai acompanhar os encaminhamentos propostos  

Plateia nova

Trabalhadores, usuários e parlamentares da Câmara Municipal de Belo Horizonte e da Assembleia Legislativa de Minas Gerais estiveram presentes na audiência pública, realizada na terça, 15/12, no salão da paróquia Cristo Redentor no Barreiro de Cima, para discutir a precariedade do funcionamento do Hospital Júlia Kubitscheck. A iniciativa de chamar a audiência, por parte da Câmara Municipal de Belo Horizonte, veio depois de diretores do Sind-Saúde fazerem uma visita ao Hospital, acompanhados do deputado Jean Freire e do mandato do deputado Rogerio Correia.

Durante a visita ficou exposta a situação de penúria do Hospital. Naquele dia de chuva, os parlamentares puderam conferir as goteiras caindo do teto do hospital referência na cura da tuberculose. E, como confirmou ontem na Audiência o deputado e médico Jean Freire, a umidade trazida pela água da chuva só aumenta os riscos de contaminação dos pacientes em recuperação, estendendo os riscos também aos trabalhadores.

Outro parlamentar presente na audiência se mostrou consternado com a situação do HJK. O deputado estadual Professor Neivaldo se disse preocupado com a situação apresentada e se comprometeu a acompanhar todo o processo, colocando-se à disposição dos trabalhadores e usuários. A audiência pública foi convocada e presidida pelo vereador Adriano Ventura (foto acima).

Clima geral de indignação

Parlamentares, Sindicato, servidores do Hospital, pessoas da comunidade e conselheiros de saúde compunham uma plateia consciente dos problemas do Hospital e unida na busca por soluções. A maior parte do tempo foi usada pelos presentes para denunciar as condições do Hospital o que fez da Audiência um ato de confirmação pública da situação de calamidade do Júlia, como é carinhosamente chamado pela comunidade.

As vozes se sucediam com indignação, como se viu no primeiro a ter a palavra, o padre Dionísio do Carmo Silva. Segundo ele, há oito anos, quando estava na Paróquia, os graves problemas do Hospital, especialmente do CTI e da enfermaria, haviam sido informados ao governo do estado. “Voltei à paróquia este ano e confirmei que o que o então governo fez foi pura enrolação porque não houve melhoria praticamente nenhuma. Espero que o governo atual não faça o que o anterior fez “, disse. Segundo o padre, a posição da comunidade será de muita cobrança pelas mudanças no Júlia.

A diretora do Sind-Saúde, Neuza Freitas (foto abaixo), falou depois do padre Dionísio. Ela lembrou que a situação do Hospital se deteriora há anos. Como exemplo, mencionou o fato de que, em 2011, houve 693 infrações registradas no Hospital pela Vigilância Sanitária sem que nenhuma providência efetiva fosse tomada. “Há cerca de 15 dias, por pouco um pedaço do teto do banheiro da maternidade não atingiu uma mãe que havia acabado de dar à luz”, contou. A sindicalista enfatizou a participação dos funcionários do Júlia, que nunca se furtaram a encaminhar as denúncias ao Sind-Saúde, segundo ela. “Espero que o governo Pimentel cumpra a promessa de campanha de (de fato) administrar o Estado e também a saúde de Minas”, protestou.

Neuza fala

Eterno canteiro de obras

A diretora do Sind-Saúde lembrou que a ala G, inaugurada em junho de 2014, encontra-se em situação lastimável com alagamentos constantes sendo que a água contaminada escoa para o semi-intensivo e para a unidade de emergência. “O semi-intensivo improvisado na unidade de emergência retira desta mesma unidade cerca de 15 leitos, inclusive os isolados, que são essenciais aos pacientes que chegam como casos suspeitos de turberculose. Há anos, eles são acomodados em um ‘puxadinho’ com risco de contaminação tanto dos trabalhadores quanto dos usuários”, disse.

Neuza apontou que o Hospital é um eterno canteiro de obras e, mesmo com o investimento de milhões, as obras não foram concluídas, ao contrário, foram abandonadas no final de 2014. O telhado custou cerca de R$ 500 mil e somente foram trocadas algumas telhas. O vestiário de funcionários custou cerca de R$ 800 mil e está interditado para funcionamento                .

“Trabalhamos com essa situação já faz anos. Várias denúncias foram feitas. Nada mudou e, no momento, também não estamos vendo mudanças. Nada funciona. Falta o básico para os trabalhadores desempenharem suas funções públicas, dando atendimento digno aos usuários do Sistema Único de Saúde, além de as relações de trabalho continuarem  as mesmas quando pensamos que fossem melhorar”, desabafou Neuza, completando que ninguém aguenta mais essa situação. O desabafo provou a reação de trabalhadores e usuários presentes que aplaudiram a diretora do Sind-Saúde.     

Conselho de saúde do hospital está suspenso

A presidente interina do Conselho Distrital do Barreiro, Ilda Alexandrino, dirigiu-se à plateia dizendo que fazia das palavras de Neuza Freitas as suas palavras. E perguntou: “aonde foi parar o Conselho atuante do JK?” Ilda pediu a imediata reestruturação do conselho.

O conselho paritário do Hospital Júlia Kubitscheck, composto em 50% pelos usuários, 25% por trabalhadores e 25% pelos gestores há décadas é o responsável por fiscalizar obras, verbas recebidas pelo hospital e a prestação de contas da direção. Foi desativado em 2013 quando a crise se agravou no hospital gerando os conflitos entre trabalhadores e gestão do hospital. “O Conselho tinha respaldo tanto para a comunidade quanto para o governo”, explica Ester Barbosa (foto abaixo), ativa conselheira do HJK há mais de 30 anos. Durante a audiência, várias pessoas sustentaram que a precarização dos serviços do Hospital é deliberada e visa sucateá-lo para promover o recém-inaugurado Hospital do Barreiro.

Ester fala

Casos de tuberculose aumentam e atendimento piora no hospital de referência

Com a crise no funcionamento do HJK, a expertise das equipes do hospital em tratar pacientes tuberculosos está ameaçada. Isso acontece no momento em que a Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou (outubro de 2015) que a doença foi a segunda maior causa de mortes por infecção em 2014, só perdendo para a aids.

Uma funcionária da área de Tisiologia do Júlia, há 23 anos, diz que os profissionais estão se sentindo desamparados e sugados no trabalho. “Se quiser fazer um pedido para o laboratório ou para a lavanderia, temos que usar nossos telefones pessoais porque o telefone do hospital nunca funciona”, conta, dando ideia de que mais do que precariedade, o atendimento dos pacientes está atingindo um grave caso de negligência. Segundo a funcionária, a ala que poderia atender 33 pacientes está com cerca de 10 ou 11 e funciona com duas profissionais responsáveis por eles. “Eles (a gestão) estão negando vagas porque se negam a colocar mais um funcionário para ampliar o atendimento”, desabafa.

O vice-presidente da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), Paulo Tarcísio Pinheiro, disse acreditar que uma solução para as grandes obras do Júlia devem acontecer no ano que vem. No entanto, ele não soube estipular prazos, uma vez que a destituição da empresa responsável pelas obras no governo anterior gerou possibilidade de recursos à Justiça e a licitação de uma nova empresa também é processo demorado.

Comissão de transição é formada ao final da Audiência

Uma comissão de transição, com 12 integrantes, foi formada para acompanhar os encaminhamentos tirados na Audiência Pública realizada no Barreiro.  São eles: Edmar José Lima; Elias Lourenço; Ester Barbosa; Ilda Alexandrino; Neuza Freitas; Maria Inês Maia; Nazaré Antônio; Padre Dionísio do Carmo; Raimunda Cristina; Reginaldo Silva; Rômulo Venades e Silvânia de Souza

Encaminhamentos

Antes do encerramento da audiência, algumas propostas foram escolhidas para serem encaminhadas para decisões da gestão do hospital e da Fhemig.

O Sind-Saúde solicitou intervenção junto à BHTrans para resolver o problema do trânsito em frente à portaria do Hospital. Atualmente, a mesma entrada serve a ambulâncias, pacientes e trabalhadores. A confusão no trânsito já provocou mortes e vários acidentes, como informou o Sind-Saúde, ironicamente, na porta do hospital.

Outro encaminhamento da audiência, a volta à atuação do Conselho fiscalizador do Júlia Kubitscheck, em fevereiro, foi assegurada pelo presidente do  Conselho Municipal de Saúde, Wilton Rodrigues. Foi sugerido que ele procure a Promotoria da Saúde do Ministério Público Estadual (MPE) para se orientar.

Em 2013, os membros eleitos do Conselho foram impedidos de tomar posse mantendo-se na mesa diretora os conselheiros que não foram eleitos na conferência do conselho de saúde do hospital. A irregularidade foi levada ao Ministério Público pelos trabalhadores e usuários.

O deputado Jean Freire, integrante da Comissão da Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, apresentou o requerimento que foi apresentado à comissão (de saúde da Alemg) solicitando audiência pública onde serão discutidos os problemas do HJK.