DANDARA EM MARCHA: prefeitura de BH quer resolver problema da moradia em módicos 671 anos.




Belo Horizonte está em pé de guerra. De um lado estão movimentos sociais e sem-teto de 6 ocupações urbanas. De outro a Prefeitura de BH e o Governo do Estado de Minas Gerais. Ameaçados de despejo, as comunidades das ocupações da Dandara (887 familias), Camilo Torres (142 familias), Irmã Dorothy (132 famílias), Novo Lagedo (1,5 mil famílias), Navantino Alves (90 familias) e Recanto UFMG (150 famílias) saíram juntas segunda-feira, 10/05/2010 na “Marcha pela Paz e Contra os Despejos”.

 

Foram mais de 1500 pessoas, que caminharam mais de 20 km , fazendo pouso a noite em uma escola, para descansar. A imprensa mineira não deu nenhuma linha sobre a marcha, seus objetivos ou quem eram aquelas pessoas invisíveis que caminhavam a margem da via pública com seus cartazes, faixas entoando cânticos e gritando palavras de ordem. Também nenhuma postura de diálogo houve por parte da Prefeitura ou do Governo do Estado, já incansavelmente procurados pelos movimentos durante meses.

 

Na terça-feira, dia 11, a marcha continuou e, determinados a mudar este quadro, os manifestantes resolveram ocupar a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional e Política Urbana (Sedru), ligada ao Governo do Estado. A polícia militar agiu de maneira extremamente truculenta, com sua tropa de choque e utilizando cães, gás pimenta e bombas. A radicalização da PM foi tanta que até mesmo o comandante da tropa empunhou cacetete e spray de gás pimenta, ameaçando iniciar pessoalmente a ação policial. 

 

Após negociação, com promessa de audiência com o Governo do Estado, houve a desocupação do prédio.  Depois de horas esperando resposta do Governo, tiveram início várias manifestações-relâmpago nas vias da cidade, trancando o trânsito, o que vem se estendendo indeterminadamente até que sejam recebidos.

No dia seguinte os jornais noticiavam a manifestação, atacando o movimento por prejudicar o tráfego de veículos. Os manifestantes estavam “sufocando BH”. Não foi dito que não haveria protestos se não houvesse descumprimento da lei, grilagem de terra pela construtora e desrespeito a constituição e estatuto das cidades pela prefeitura de BH e Governo do Estado. A mídia tenta jogar trabalhadores contra trabalhadores, alegando que a manifestação atrasa as pessoas em chegar ao serviço. Mas é importante lembrar que ela tem dois pesos duas medidas. Nada foi dito quando o ex-governador Aécio fechou a praça da liberdade e transformou em verdadeiro caos o transito de BH na véspera de feriado. Nem se falou que aquela cerimônia, a mesma que paralisou o transito, custou  centenas de milhares de reais e não teve o menor sentido além do fim eleitoral de cacifar Aécio e Anastasia.

A tentativa é clara em tentar associar os sem-teto com a baderna, a confusão, o incomodo. Novela assim já foi vista nas páginas de VEJA e no tratamento dado ao MST. Pudessem chamar a todos os movimentos sociais de sem-terra e se pouparia a criação de linhas editoriais específicas. E talvez pensando desta forma fez exatamente assim o Jornal Estado de Minas. O tablóide mineiro acusa os três grupos sociais que lideraram a manifestação de serem ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. O MST participou do início de uma das ocupações (Dandara), e apóia abertamente aos sem-teto e a luta por moradia, mas não é organicamente ligado a nenhum dos grupos.

Com a confusão criada, e a repercussão na mídia, a Prefeitura se apressou em disparar dados: citou o déficit habitacional de Belo Horizonte, com dados próprios, e as políticas que executa para combatê-lo. Surpreendentemente, na nota a prefeitura de Márcio Lacerda encontrou somente 53 mil moradias em deficit. Pesquisa da Fundação João Pinheiro, publicada em 2008 revela que na verdade faltam 170 mil unidades habitacionais.

 

Também pelos dados fornecidos pela nota publicada, Lacerda informa que existem diversos programas e políticas de habitação. Mais uma vez a informação surpreende. As políticas publicas citadas, com exceção do Orçamento Participativo da Habitação (OPH), não combatem o déficit habitacional. São programas cosméticos que não resolvem a situação, servindo para transferir gente pobre que mora em área que a especulação imobiliária requer para seus empreendimentos para outros lugares longe de áreas valorizadas pelo mercado. Quando muito são políticas de regularização, que somente conferem o título a pessoas que já tem moradia, porém irregular.

 

O OPH, por sua vez, é uma piada pronta, como já dizia um humorista famoso: sob o pretexto de respeitar os direitos de quem se cadastrou nas políticas habitacionais, a PMBH se esconde atrás de uma fila que anda a passos de tartaruga. Se dividirmos 3,8 mil famílias beneficiadas (dados citados na nota) por 15 anos de existência do programa, chegamos a 253 familias por ano!!! Ou seja, se o déficit habitacional da Prefeitura permanecer em 53 mil famílias (desconsiderando o êxodo rural, a pobreza, o crescimento da população, etc), vai demorar 209 anos para solucionar o problema da moradia em BH. Considerando os dados da Fundação João Pinheiro, serão necessários 671 anos!!!

 

Atualmente as famílias estão acampadas na Praça 7, ponto central da capital mineira. A disposicão é resistir indeterminadamente, com a solidariedade da população, à espera de serem ouvidos.

 

Alexandre Chumbinho

 

 

Fonte: MST

 

 

Veja nota da Ocupação Dandara sobre o movimento organizado no início de maio